terça-feira, 15 de março de 2011

CRISANTEMOS

PAI

Sempre que vou ao teu quarto, pai,
a voz deste silêncio é a tua voz,
que eu ouço sem cessar em mim, em nós...
Em tudo um mar de pranto cai.

Um longo ano já passado vai,
sobre a hora fatal, cruel e atroz
em que partiste, pai, deixando sós
os que eram teus, soltando um longo ai.

Saudoso longo ai que só se acaba...
quando nos cobrir, talvez, a terra cava
da sepultura, em hora já ou longa.

Até à derradeira hora suprema,
Hei-de cantar a dor deste poema,
num ai que pelo espaço se ditonga.

1969


MAE

Minha mãe, minha mãe...não conheci
tão doce bem, que Deus nos sabe dar.
Minha mãe, minha mãe, ao pé de ti,
ai não me lembro, ò mãe, de te beijar.

A mais profunda pena que eu sofri
foi, minha mãe, de ti me não lembrar;
pra louvar a mulher de que nasci
e, como filho teu, poder-te amar.

O maior bem que existe nesta vida
é termos uma mãe estremecida
que vive só para nós e nosso bem.

Não me lembro de ti. Pena infinita.
Que no meu peito eternamente grita
até morrer, ó minha santa mãe.


NA CAMPA DE MEU PAI

Não somos mais que poeira levantada
No mundo da luxúria e da ilusão:
Se ora é manhã, é logo escuridão,
Escuridão mais fria e mais cerrada.

Honrarias que são? Ai, não são nada!
Quimeras só quimeras e que vão
Desviando do fio da razão
A nossa alma fraca e descuidada.

Aos pés da tua campa estou agora
A meditar naquela negra hora
Em que pra longe transmigou teu ser.

Meu pai que estás na Terra da Verdade,
deixaste em mim um mundo de saudade
a qual so passará quando eu morrer.

4.11.82


PASCOAES

Vejo-te, ó Pascoaes, a meditar
Nessa estátua de bronze que te ergueram.
Tuas ideias, poeta, não morreram:
No mundo as ouço, ainda, alto a gritar.

Teu fogo genial sinto-o no ar…
E quantos nesse fogo se aqueceram!
Humildes flores que num jardim nasceram
E avezinhas gentis nos céus a voar.

A pedra, a própria pedra inerte e fria
No teu verbo, poeta, se aquecia,
A tudo davas vida e coração.

Foste expressão da madre natureza
Que cantaste em arroubos de beleza,
Sagrado pela alma do Marão.

10.3.80



ANTO

A Coimbra eu hei-de ir pra visitar;
A Coimbra hei-de ir só para ver,
Pra ver alguém… alguém que soube ser
Poeta verdadeiro e singular.

A Coimbra hei-de ir pra lhe falar;
E pra sentir com ele o seu sofrer,
Que na cruz o pregou até morrer
Mas pregado na cruz sempre a cantar.

A Coimbra hei-de ir e hei-de ir sozinho
Para entender melhor no teu cantinho,
Essa tua alma, poeta, sem rival!

A Coimbra eu hei-de ir , o peito em reza,
Pra comungar, António, essa tristeza
Como outra assim não houve em Portugal.


PADRE AMADEU

Recordo o professor Padre Amadeu
Do saudoso Colégio de Amarante…
(Ai como a vida passa num instante,
Como de novo a velho passei eu!...)

Suas belas lições quem as esqueceu, S
e elas ficaram, em nós pla noite adiante
Com esse brilho puro do diamante,
O qual em nós jamais escureceu?

Como ele interpretava o grão Camões,
Nessas horas de sérias aflições,
Para o nosso saber inexperiente!

Padre Amadeu, relembro com saudade
O teu grande saber e a vontade
De um dia os teus alunos serem gente!


Adeus

Ao pó de que saíste foste dado,
Em manhã de ditosa primavera.
A natureza era um hino de quimera
Iluminada por um sol doirado.

Mas surge a morte quando mal se espera,
Que não escolhe plebeu nem coroado,
Levando-te agora a ti, triste coitado,
Irei eu, amanhã, nessa galera.

Levaste a vida sem saberes da vida,
O que ela tem na sua realidade…
E talvez fosses mais feliz assim…

Descansa, amigo, na letal jazida.
E que o espírito teu, na Imensidade,
Esteja isento da Dor, na Luz-sem- Fim.


Álvaro Ministro

Bom Álvaro, meu amigo e companheiro,
Da minha infância e verde mocidade;
Como eu revivo, agora com saudade,
Esse tempo tão branco e tão fagueiro.

Aspiras o cigarro prazenteiro -
grande amigo da tua intimidade -
ele era toda a tua felicidade:
maior que possuir o mundo inteiro.

De mim, por noites negras ou de luar,
A tossir, a teimar, a conversar.
Eu figuro-te, amigo, lado a lado,

Plangendo uma vez mais tua viola,
Com mãos de mestre! Ai, como consola
O ter presente o que é já passado!



A tua imagem, Álvaro, anda comigo,
Nem fugirá jamais do meu olhar;
E no silêncio, a sós, eu falo e digo
Do meu saudoso e grato recordar.

A saudade que eu sinto, bom amigo,
Dentro em meu coração, a soluçar:
É sinal verdadeiro, que eu bendigo,
Que te estimei e sempre soube amar.

Tua presença eu sinto-a viva e forte
E chego a duvidar se a própria morte
Te levou deste mundo, realamente.

Quando a amizade é pura e verdadeira,
Quem morre fica, em nós, doutra maneira,
mas fica, em nós, falando com a gente.


ZÉ DO MANETA

Pobre Zé da Maneta, que passaste
Desta vida mortal pra outra vida!
Seja-te leve a terra e merecida a paz,
lá nessa Luz à qual voaste.

Tuas respostas cheias de piada
E duma certa de dose de ironia
Jamais as ouviremos, neste dia,
Que bem cedo será noite cerrada.
Nunca em teu rosto andou um ar bisonho:
Na tua alma ardia a luz de um sonho
E pró Tédio tua rias com desdém.

Se no teu bolso houvesse uns escuditos
Pra enxugar, no Copa, uns bons copitos,
Tu eras, Zé, mais rico que ninguém.






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